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Cristina Figueirinhas: católica que se tornou revolucionária

Inserido num ciclo dedicado às comemorações dos 50º Aniversário do 25 de Abril, o Terra da Fraternidade divulga micro- biografias de algumas dos católicos com um papel de destaque no combate ao regime fascista e conquista da democracia.
Todas as micro-biografias são extraídas da tese de Doutoramento de Edgar Silva: "Vendaval de utopias. Do catolicismo social ao compromisso político em Portugal (1965-1976). Os católicos da Revolução e o PCP."

Cristina Figueirinhas: católica que se tornou revolucionária

No dia 8 de maio de 1972, a polícia interrompe uma reunião geral de alunos, no Porto, em Economia, e deteve 60 estudantes universitários. Mais tarde foram postos em liberdade. No entanto, Cristina Figueirinhas ficaria presa e só viria a ser solta no dia seguinte.

A 14 de maio do mesmo ano, no bar da Faculdade de Ciências, o diretor, acompanhado de outro professor e de um polícia, identifica, revista e prende duas estudantes, por posse de documentos subversivos. Uma das estudantes a ser detida seria Cristina Figueirinhas, estudante do 1.º ano de Economia. Seria julgada por atividades subversivas e por incitar à luta estudantil.

Cristina Figueirinhas era natural do Porto, onde nasceu a 10 de junho de 1953, num meio profundamente católico, numa família que afirmava a grandeza eclesial de D. António Ferreira Gomes, com ligações aos dominicanos no Porto e à comunidade católica da Serra do Pilar. O seu pai, Mário Figueirinhas, foi uma grande figura do catolicismo em Portugal, um editor de obras marcantes da cultura portuguesa e do humanismo cristão.

Por influência do catolicismo social e, em particular, tendo como referência muito significativa o Pe. Manuel Vieira Pinto – o futuro bispo de Nampula –, Cristina Figueirinhas viveu com enorme entusiasmo os desafios colocados pelo Movimento por um Mundo Melhor. Vieira Pinto impulsionara em Portugal aquele movimento e aquela motivação, como apelo concreto, para tornar o mundo melhor, com mais atenção e cuidado, mais justiça e paz.

A correspondência de Cristina Figueirinhas dá-nos conta do fascínio e da vontade de compromisso social de quem, como ela, participara na sua cidade nas Conferências de Maio, de 1968, dinamizadas por Manuel Vieira Pinto no Palácio de Cristal.

Naquele contexto, Cristina Figueirinhas assumiu, desde muito jovem, uma consciência social e a participação nos movimentos associativos e estudantis. Fez parte da Juventude Cristo Rei, no Porto, com os frades dominicanos, e nos campos de trabalho em Baião, promovidos pela Cooperativa Confronto. No Liceu Garcia da Orta, no Porto, Cristina tornou-se dirigente estudantil, onde se terão proporcionado os primeiros contactos com estudantes comunistas. Integrou o Movimento Associativo Estudantil do Porto, na CPA (Comissão Pró-Associação dos Liceus) a partir de 1968 e, mais tarde, a Associação de Estudantes de Economia do Porto, sendo então dirigente dessas estruturas.

O catolicismo social que marcara a história de Cristina Figueirinhas desembocará nas exigências de um agir católico mais consequente, transformador da sociedade, e, cada vez mais, viria a gerar uma outra consciência política.

Nas lutas estudantis, no experimentar das implicações da ditadura de Salazar e Caetano, no confronto com a repressão política, no contexto de movimentações e relações de confiança, aconteceu na vida de Cristina Figueirinhas uma maior politização.

Em 1970, Cristina Figueirinhas tornou-se militante do PCP, integrando primeiro as estruturas estudantis daquele Partido e participando na União dos Estudantes Comunistas (UEC).

Detida pela polícia política, no ano de 1972, na Universidade do Porto, e levada a julgamento, Cristina Figueirinhas, a meio do julgamento, passou à clandestinidade como funcionária do PCP. Da clandestinidade escreveria aos seus pais procurando dar conta da nova etapa de vida, da complexidade da opção revolucionária.

O compromisso político e a militância comunista implicaram para Cristina a imersão na clandestinidade até à revolução de 25 de Abril de 1974, tendo trabalhado na estrutura do Comité Regional das Beiras do PCP, onde participou na organização das lutas do movimento camponês. Naquele tempo, assegurou, entre outras tarefas, a defesa de uma casa clandestina no interior rural, em Coimbra.

A partir do 25 de Abril, Cristina Figueirinhas passou a desenvolver tarefas de direção política em Aveiro, integrando a Comissão Distrital do PCP, com a ligação partidária a vários concelhos. A partir do final de 1975 passou a fazer parte da Comissão Distrital de Coimbra do PCP, sendo também ativista no Movimento Democrático das Mulheres (MDM).

Cristina Figueirinhas faleceu muito jovem, com 33 anos de idade, a 30 de junho de 1986, em virtude de um grave problema de saúde.

Cristina Figueirinhas corporiza na sua experiência de militante do catolicismo social na história contemporânea portuguesa um percurso de uma militante católica que se tornou revolucionária. Poderíamos dizer que a sua crescente prática cristã desembocou no dever do agir transformador. As suas convicções da fé requereram a intervenção política.

Por isso, a trajetória de compromisso político de Cristina Figueirinhas, no que implicou de militância comunista, foi muito semelhante à de outros comunistas portugueses. Em muitos dos casos, a militância comunista correspondeu a uma desafetação das ligações ao catolicismo, tal como se verificou com Cristina. Mesmo assim, Cristina Figueirinhas continuará a figurar nesse universo vasto e plural dos “católicos da revolução”.

7/11/2025

A equipa assume a gestão editorial de Terra da Fraternidade, mas os textos de reflexão vinculam apenas quem os assina.

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