As contas e a vida
Vivemos uma profunda crise social. Na habitação, na Saúde, na Educação, nos Salários e Pensões. Recentemente aqui escrevi:- há cada vez mais famílias a terem de optar entre pagar ao senhorio ou pôr a comida na mesa. Cada vez sobram mais dias, cada vez falta mais salário ou pensão para chegar até o fim do mês.
Artur Ribeiro é comerciante e foi Vereador da CDU na Câmara Municipal de Matosinhos.
Hoje em dia, entre nós, um dos temas mais em voga é o das contas certas. É preciso desmistificar. À partida, todos somos a favor da gestão equilibrada de receitas e despesas, todos queremos contas certas. Se não as temos a quem cabe a responsabilidade? Será aos trabalhadores, cujo magro salário não chega ao fim do mês? Será aos reformados e pensionistas que após uma longa vida de trabalho recebem trezentos ou quatrocentos euros de pensão?
A culpa no desacerto das nossas contas está nas políticas praticadas, que não defenderam o interesse nacional. É aí que bate o ponto!
Quando a Banca precisou de apoio, o Estado correu em seu socorro; quando parcerias público-privadas deram para o torto, foi o bolso dos contribuintes que salvou a situação; quando grupos económicos deslocalizaram a sede das empresas para o estrangeiro escapando ao fisco, o Estado fez vista grossa. E agora, pasme-se, quando a Banca ganha milhões de euros diariamente, sublinho quando a Banca ganha milhões de euros diariamente (devido ao aumento das taxas de juro do Banco Central Europeu), o Estado, em nome das contas certas não mexe uma palha, o Estado não vai recuperar o esforço que fez para salvar a Banca, e em nome das contas certas prefere que muitas famílias sejam forçadas a abdicar de uma vida digna para poderem suportar prestações altíssimas das prestações das suas casas.
A propósito do Dia Mundial dos Pobres, o Papa Francisco disse “Os pobres são pessoas, têm rosto, história, coração e alma” e disse também “a pobreza não é fruto do destino, é consequência do egoísmo” e disse ainda “é decisivo dar vida a processos de desenvolvimento onde se valorizem as capacidades de todos”.
É claro que precisamos de contas certas, mas a economia tem que estar ao serviço das pessoas.
É urgente aumentar muito o nosso parque público de habitação:- apenas com 2% do total é o menor, percentualmente, em toda a europa. E é inaceitável pagar uma renda de setecentos euros por um quarto ou mil e duzentos por um T1.
É urgente melhorar a capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde:- não é tolerável que tenhamos 1,3 milhões de pessoas sem médico de família, como não é admissível esperar anos por uma cirurgia.
É urgente investir na Educação, nos equipamentos, na motivação dos professores através da melhoria das carreiras e das remunerações.
É urgente apostar na Justiça para que os processos não sejam expostos na praça pública e acabem por prescrever sem julgamento.
É urgente investir nas forças de segurança, evitando esquadras em mau estado e agentes desmotivados.
É urgente travar a fuga para a emigração dos nossos jovens licenciados (mais de setecentos mil desde 2012).
É urgente reduzir os índices de pobreza (mais de dois milhões de pobres em Portugal), o que obriga ao rápido aumento das pensões e dos salários.
Ao comemorarmos os cinquenta anos do 25 de Abril, temos de proclamar que o objetivo das contas certas tem de ser compaginável com a vida dos Portugueses e com a defesa intransigente dos direitos consagrados na Constituição da República.
Com Abril para todos.
19/01/2024
A equipa assume a gestão editorial de Terra da Fraternidade, mas os textos de reflexão vinculam apenas quem os assina.