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A JMJ caminha para o fim: notas de balanço

A realização da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023, anunciada em 2019, no Panamá e adiada devido à pandemia, foi sem margem para dúvidas, uma grande realização da Igreja Católica, que trouxe a Portugal muitos milhares de jovens de vários países, e no País mobilizou muitas pessoas e entidades.

A JMJ caminha para o fim: notas de balanço

Alexandre Valério é licenciado em Geografia e foi dirigente de uma IPSS.

Uma realização que procurou ultrapassar as fronteiras do mundo católico, procurando envolver jovens de outras confissões, enquanto voluntários, e que teve um momento importante no diálogo ecuménico e inter-religioso, com a realização do encontro do Papa Francisco com membros de outras confissões religiosas.

Um outro sinal da importância da JMJ para o futuro da Igreja Católica foi a dinâmica desenvolvida para a mobilização de jovens, indo para além dos eventos de carácter religioso, com a realização de múltiplas iniciativas de música, convívio, desporto, lazer, entre outras, um pouco por todo o País, sejam elas de carácter paroquial ou diocesano. Promovendo com isso uma ideia, constantemente afirmada em intervenções do Papa Francisco, de promover uma Igreja de proximidade.

Conhecer os reais impactos da JMJ 2023 em Portugal e no mundo, exige tempo, contudo o secretário executivo da Fundação JMJ, Duarte Ricciardi, há meses, explicitou que o principal legado será “envolver tantas pessoas, muitas delas, mais desligadas ou com pouca participação na vida da Igreja e que, agora, estão empenhadas em criar algo tão importante para a mesma” e que “ficará não só para a vida da Igreja, mas também na interação da Igreja com as empresas, a sociedade civil, o Governo e as câmaras municipais”, dando assim uma perspectiva dos seus principais objectivos.

A realização da JMJ não passou incólume a críticas, naturais num evento desta dimensão, nomeadamente, pelos custos anunciados e pela falta de informação ao nível da mobilidade. Críticas por vezes justas, e que reforçam a ideia e a necessidade de maior cuidado no planeamento, na informação pública e no controlo das despesas.

Apenas no final será possível apurar os custos reais, sem dúvida muitos superiores aos anunciados, ainda que alguns sejam investimentos para perdurar no tempo, como o parque Tejo Trancão ou o Terraplano no Passeio Marítimo de Oeiras. O presidente da Câmara Municipal de Oeiras já veio reconhecer mais do que estava previsto. Enquanto o Governo e a Câmara Municipal de Lisboa mantêm o discurso de que não ultrapassaram o orçamentado. A seu tempo veremos.

Mas a realização da JMJ foi também momento de aproveitamentos políticos, seja a partir de órgãos de soberania, mas igualmente a nível local, com o edil de Lisboa a deslocar-se, por sua iniciativa a Roma para “tranquilizar” o Papa Francisco, após as críticas ao custo do altar palco no parque Tejo Trancão. Como também houve quem procurou agitar a ameaça da “insegurança” como bandeira contra os imigrantes, o que lhe mereceu duras críticas entre muitos católicos e da própria organização da JMJ.

No plano nacional, e para a Igreja Católica, a realização da JMJ fica marcada por uma ampla dinâmica de jovens, como há muito não existia, mas também pela ascensão do bispo Américo Aguiar, coordenador da JMJ, à função de Cardeal, medida enquadrada nos esforços do Papa Francisco em renovar e rejuvenescer o colégio de Cardeais. O nome de Américo Aguiar era há muito falado para Cardeal, resta saber que funções terá no futuro, sendo que o sucessor do actual Patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, será empossado no início de Setembro.

Um outro elemento significativo é o programa do Papa na JMJ ter incluído um encontro com as vitimas de abusos sexuais na Igreja Católica, procurando desse modo contribuir para ultrapassar uma realidade concreta e conhecida que marca a vida da instituição e de pessoas — e que declarações de membros da hierarquia em Portugal, não ajudaram a apaziguar.

A JMJ 2023 decorreu num mundo em grande convulsão, onde aumentam os perigos para a paz e se exigem mais vozes, mais intervenção e medidas concretas para a resolução dos conflitos, numa em que o Papa persiste. Porque não podemos ignorar que mais guerra significa mais fome no mundo, mais destruição e mortos na frente de guerra, mais imigrantes afogados no Mediterrâneo ou mortos no deserto, ou noutras regiões.

Ao longo da preparação e realização da JMJ muitas foram as afirmações da necessidade de comunhão, solidariedade, paz e amizade. Ideias justas e que exigem uma tradução concreta, porque nenhum católico, nenhum cristão, nenhum crente, pode aceitar um mundo, onde poucos concentram cada vez mais riqueza, como os bancos em Portugal com 10 Milhões de lucro/dia, e muitos, e cada vez mais muitos, clamam por direitos, contra a fome, por salários dignos, por uma habitação condigna e acessível, entre muitos outros males que assolam a humanidade. O clamor dos pobres e dos povos tem de ser ouvido e de ser exigente nas medidas concretas. Uma Igreja Católica de proximidade, como defende Francisco, não pode ignorar semelhante realidade, sob pena de facilitar o crescimento dos projectos populistas. A JMJ 2023 Lisboa está a chegar ao fim. Dentro de pouco tempo partirá a caminho de novas paragens.

5/08/2023

A equipa assume a gestão editorial de Terra da Fraternidade, mas os textos de reflexão vinculam apenas quem os assina.

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