No relógio da guerra tocam horas de paz
Falar de tempo é um dos desafios mais fascinantes que tem ocupado a humanidade na compreensão profunda, complexa, e inatingível daquilo que é o impossível de ser abarcado em toda a nossa inteligência.

Duarte Nuno Morgado é formado em Teologia, membro de diversas associações de cariz cultural e social e atualmente Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Loures.
No tempo ninguém manda, e ninguém o controla, escapando-nos em milissegundos, minutos, anos, milénios. Mas como se isso não bastasse, pelo facto de o tempo ser passado, presente e futuro, não o podemos circunscrever a uma geografia e a uma vontade nossa. Consequências imediatas desta realidade imposta é que todas as nossas decisões se tornam efectivas, repentinamente passado, realizadas, existentes, fazendo inapagáveis todos os nossos actos.
Para mim o tempo é um juiz que avalia toda a história humana e o mestre que nos ensina em cada momento as hipóteses que temos diante de nós com todas as suas amplas possibilidades de decisão. E todos o sabemos, porque todos vivemos. O que eu faço agora tem impacto, mesmo que a minha decisão seja nada fazer. Trata-se do tempo no comando de todas as coisas, para lá mesmo da ambiciosa vontade humana.
O mesmo tempo faz-se repositório de memórias, aprendizagens várias, e de educador que nos permite olhar o horizonte e perceber que tudo que o que vemos hoje pode ser melhor. Mas para que assim seja, importa saber como lemos o tempo e que lições queremos ou não tirar dele. Veja-se no que se refere à guerra.
Não nos faltam motivos para reflectir no passado e nos erros desse tempo, mas ao que parece não agimos de acordo com o que aprendemos. Não sabemos já todos as consequências nefastas de conflitos contínuos como aqueles que assistimos em todo o mundo? Em todo o mundo e em todas as áreas. Não nos falta guerra, desde as coisas mais simples às de maior envergadura. Lembro-me até das palavras de um sacerdote católico meu amigo: "só não lançamos rockets uns aos outros porque não os temos à mão". Porque em tanta coisa, mesmo que simples, há sempre movimentos de guerra, de ódio, de vingança, e não nos apercebemos que se a vida é o bem mais precioso para cada um de nós, quanto mais tempo perdemos, menos vida temos todos.
Que tempo é este? Que tempo tenho eu à disposição? De que tempo quero dispor? O relógio da humanidade está cada vez mais próximo de uma hora última. Não será ocasião de pensar que o tempo tem muito mais valor que aquele que se tem perdido em cada conflito, armado ou não? Diria que olhando para os ponteiros em movimento, passando por nós, o tempo indica que são horas de paz, horas de prosperidade, horas de felicidade, horas de vida. Mas será que o relógio é igual para todos? Talvez o problema resida aí mesmo, para cada um, o seu relógio, o seu tempo, a sua agenda... pessoal, política, ideológica. É o problema do poder que vem rivalizar com o tempo, porque para ele tudo vale. Ser poderoso torna-se garante de vida, mas a que preço?
Afinal, sem um tempo comum, corremos o perigo de nos perdermos para sempre, e então nada feito, porque o tempo acabará por se esgotar em si mesmo, e já de nada servirá ser-se todo poderoso, porque não ficará nada nem ninguém sobre o que/o qual se possa exercer esse mesmo poder.
Pergunta-te se queres continuar a perder o teu tempo e de que modo: guerra ou paz; morte ou vida? Eu opto por viver, por isso decido caminhar pela paz!