Paz e comunhão (1)
As mensagens dos Papas para a celebração do Dia Mundial da Paz tomam sempre a forma de textos que respondem a exigências de um determinado tempo. A mensagem do Papa Francisco para 2023 não é diferente (1).
Sérgio Dias Branco é professor da Universidade de Coimbra, dirigente da CGTP-IN, e leigo da Ordem Dominicana da Igreja Católica.
As suas reflexões articulam a preocupação com a actualidade tendo como base a fé cristã. O mesmo é dizer que a crença em Deus e na Criação, na nossa origem comum, e também em Jesus Cristo, devia-nos impelir para o horizonte da fraternidade humana.
A mensagem começa por destacar a dimensão comunitária desta passagem bíblica: “Com efeito, vós próprios sabeis perfeitamente que o Dia do Senhor chega de noite como um ladrão.” (1Ts 5,2). São Paulo dirige-se aos crentes de Tessalónica como comunidade exortando a que estejam vigilantes porque Deus virá quando menos se espera, porque a nossa esperança é muitas vezes frágil como um vidro fino e passageira como as ondas do mar. Isso quer dizer que é, no fundo, uma esperança humana, não é a esperança de Deus, não é a esperança que nos foi oferecida através de Cristo, que é firme como uma rocha e constante como uma árvore sem idade, de raízes profundas. Vigiar, Francisco lembra bem, é cuidar com atenção do mundo, dos outros, de nós mesmos, isto é, “procurar o bem, a justiça e a verdade” (2).
A nossa fé tem como alicerce a fidelidade absoluta de Deus. Deus está presente sobretudo quando não esperamos ou quando desesperamos. Então, este cuidado atento que se espera de alguém com a fé cristã tem um contexto que é composto por aquilo que cada um de nós vive e aquilo que vivemos como comunidade. É aqui que entra a preocupação com a COVID-19 e o modo como desestabilizou o nosso dia-a-dia. A par do problema de saúde pública que se colocou, a mensagem identifica “um mal-estar geral,” nomeadamente devido a “longos períodos de isolamento e diversas limitações da liberdade” (3). O texto é bastante claro na descrição das consequências nefastas da pandemia, em particular para os trabalhadores com vínculos precários: não podemos esquecer como a pandemia atingiu pontos sensíveis da ordem social e económica, pondo a descoberto contradições e desigualdades. Ameaçou a segurança laboral de muitos e agravou a solidão sempre mais generalizada nas nossas sociedades, especialmente a solidão dos mais frágeis e pobres. Pensemos, por exemplo, nos milhões de trabalhadores não regularizados em muitas partes do mundo, que ficaram sem trabalho nem qualquer apoio durante todo o período de confinamento. (4)
25/01/2023
A equipa assume a gestão editorial de Terra da Fraternidade, mas os textos de reflexão vinculam apenas quem os assina.
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(1) Papa Francisco, “Mensagem para a Celebração do 56.º Dia Mundial da Paz: Ninguém Pode Salvar-se Sozinho. Juntos Recomecemos a Partir da Covid-19 para Traçar Sendas de Paz,” 1 Jan. 2023, https://www.vatican.va/content/francesco/pt/messages/peace/documents/20221208-messaggio-56giornatamondiale-pace2023.html.
(2) Ibid., 1.
(3) Ibid., 2.
(4) Ibid.