O activismo católico na construção da paz (2)
A Pax Christi também tem uma secção nos Estados Unidos, espalhada pelo país. Na década de 1960, envolveu-se na organização de boicotes a empresas que discriminavam a população negra, participando solidariamente no movimento pelos direitos civis que tentava acabar com a discriminação social e económica no estado do Mississippi.
Sérgio Dias Branco é professor da Universidade de Coimbra, dirigente da CGTP-IN, e leigo da Ordem Dominicana da Igreja Católica.
Ainda hoje as actividades da Pax Christi USA dão particular relevo ao combate ao racismo e à xenofobia, ao direito à segurança daquelas pessoas para quem o quotidiano é uma guerra incessante. Na campanha “Pão Não Pedras” (“Bread Not Stones”) de 2022, que reedita uma semelhante entre 1999 e 2000, a organização desafiou a administração americana a “redireccione os gastos militares para lidar com as causas profundas de conflitos, injustiças, desigualdades e catástrofes ambientais.” (1) E lançavam estas perguntas: “Existe uma maneira melhor de salvaguardar as pessoas e proteger a dignidade humana do que gastar centenas de bilhões de dólares em militarismo e armas de destruição em massa? Podemos dar às nossas comunidades mais do que pedras?” (2) Daí a prioridade do alimento em vez das armas nos Estados Unidos, olhando para o presente, como forma de “desafiar as prioridades orçamentais,” porque segundo afirmam: “Apesar do fim da Guerra Fria na década de 1990, os EUA continuaram a operar com a mentalidade de que a paz é garantida por meio do poderio militar, da fabricação de armas e do investimento na preparação para a guerra.” (3)
Internacionalmente, a Pax Christi tem procura ter impacto nas decisões políticas, promovendo a não-violência como um estilo de política para a paz, que a Igreja considera estar espelhado na Carta das Nações Unidas. Por isso, o Papa Francisco escreveu na recente encíclica Fratelli Tutti, sobre a amizade social:
Dado que se estão a criar novamente as condições para a proliferação de guerras, lembro que “a guerra é a negação de todos os direitos e uma agressão dramática ao meio ambiente. Se se quiser um desenvolvimento humano integral autêntico para todos, é preciso continuar incansavelmente no esforço de evitar a guerra entre as nações e os povos. Para isso, é preciso garantir o domínio incontrastado do direito e o recurso incansável às negociações, aos mediadores e à arbitragem, como é proposto pela Carta das Nações Unidas, verdadeira norma jurídica fundamental.” Quero destacar que os 75 anos de existência das Nações Unidas e a experiência dos primeiros 20 anos deste milénio mostram que a plena aplicação das normas internacionais é realmente eficaz e que a sua inobservância é nociva. A Carta das Nações Unidas, respeitada e aplicada com transparência e sinceridade, é um ponto de referência obrigatório de justiça e um veículo de paz. (4)
Em 1983, a Pax Christi International recebeu o Prémio UNESCO de Educação para a Paz, e em 1987, o Prémio Mensageiro da Paz da ONU. Tem estatuto consultivo na ONU, na UNESCO, e no Conselho da Europa. A rede Pax Christi é hoje composta por 120 organizações em 60 países nos cinco continentes. Além da tomada de posição sobre acontecimentos e desenvolvimentos, os seus focos da intervenção, que se estendem às secções nacionais, têm sido essencialmente três: o Tratado de Proibição de Armas Nucleares, o extrativismo na América Latina, e a paz no Médio Oriente.
Sem desvalorizar a relevância do controlo das indústrias extrativistas na América Latina, vou-me centrar no primeiro e no terceiro tópicos, por uma questão de tempo e de acerto com o tema desta sessão pública.
27/02/2023
Fraternidade, mas os textos de reflexão vinculam apenas quem os assina.
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(1) Pax Christi USA, “Bread Not Stones 2022: Redirect military spending to address the root causes of conflict, injustice, inequity, and environmental catastrophe,” 3 Mar. 2022 (trad. minha), https://paxchristiusa.org/2022/03/03/bread-not-stones-2022-redirect-military-spending-to-address-the-root-causes-of-conflict-injustice-inequity-and-environmental-catastrophe.
(2) Ibid., par. 4 (trad. minha).
(3) Ibid., par. 1 (trad. minha).
(4) Papa Francisco, carta enc. Fratelli Tutti (sobre a amizade social), 3 Out. 2020, 257, https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-francesco_20201003_enciclica-fratelli-tutti.html.