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O activismo católico na construção da paz (1)

A pacificação ou a construção da paz faz parte da tradição cristã e, particularmente, da Doutrina Social da Igreja Católica.

O activismo católico na construção da paz (1)

Sérgio Dias Branco é professor da Universidade de Coimbra, dirigente da CGTP-IN, e leigo da Ordem Dominicana da Igreja Católica.

Mesmo existindo polémicas em torno de aspectos do pacifismo, da não-violência, e da chamada teoria da “guerra justa,” podemos dizer que há um entendimento de que, face à guerra, o esforço dos católicos deve ser sempre colocado na negociação e manutenção da paz, na diplomacia e na arbitragem. (1)

A Pax Christi é a maior e mais importante organização católica que participa no movimento internacional pela paz. A sua missão é “criar culturas de paz e reconciliação que irão transformar um mundo abalado pela violência, pelo terrorismo, pelo aprofundamento das desigualdades e pela insegurança global.” (2) No centro da acção da Pax Christi está a crença de que a religião deve ser uma força inequívoca para a paz e a justiça social, comprometida com a não-violência, a desmilitarização e o desarmamento, a segurança humana, os direitos humanos e o estado de direito como base para sociedades pacíficas. Podemos dizer, portanto, que esta organização trabalha para atingir três objectivos básicos, concretos, e articulados: a paz, a reconciliação, e a não-violência. (3)

A paz é entendida como dependente da justiça. Isto é, só num mundo onde os direitos humanos sejam respeitados e as necessidades humanas sejam atendidas, e cada pessoa se sinta segura e valorizada nas comunidades onde se insere, no local de trabalho, no lugar onde mora, podemos falar de paz. Desta maneira, não se trata apenas de as armas estarem caladas, mas de um progresso social que promova a justiça e combata a exploração e a intimidação. Vale a pena desejar e lutar por esta paz. Como escreve o dominicano Frei Betto: “Inútil querer a paz sem, antes, erradicar as causas que produzem violência e guerra.” A partir de uma leitura do livro do profeta Isaías, ele conclui que “sem uma ética globalizada, o atual modelo neoliberal de globocolonização não cessará de colocar os interesses privados acima do direito público; as fontes de riqueza acima do bem-estar da população; as ambições imperialistas acima da soberania dos povos.” (5)

A reconciliação, por sua vez, é muitas vezes esquecida, porque vai contra a lógica da guerra, da manutenção e incitação permanente de conflitos. Reconciliar quer dizer consertar relações entre indivíduos, comunidades, ou países após tempos de violência ou disputa. É um processo que pode ser bastante longo, que envolve sarar feridas profundas, mas que é essencial para construir uma paz sólida e duradoura.

Por fim, a não-violência corresponde a uma forma pacífica de viver e conviver, de fazer escolhas que respeitam o outro e as suas escolhas. Ao mesmo tempo, apresenta-se como um desafio à injustiça social, oferecendo alternativas à guerra e à escalada violenta das tensões e conflitos. Esta abordagem envolve um renovado e determinado apreço pela resistência à tentação da agressividade, pela diplomacia como caminho, e pela cooperação como relação.

A história da Pax Christi começou no período pós-Segunda Guerra Mundial na Europa. Pax Christi quer dizer “Paz de Cristo” em latim. Não é, por isso, uma noção de paz qualquer, mas inspirada nos valores morais revelados por Jesus de Nazaré, prisioneiro político crucificado pelo Império Romano. A organização foi estabelecida em França em 1945 por inspiração de Marthe Dortel-Claudot e do bispo Pierre-Marie Théas. Marthe e Pierre-Marie eram cidadãos franceses que queriam contribuir para a reconciliação entre cidadãos franceses e alemães, após a derrota do nazi-facismo no fim de uma guerra devastadora. As primeiras acções da Pax Christi tiveram, por isso, o propósito definido de reconciliação entre a França e a Alemanha. Mas rapidamente o movimento expandiu o seu âmbito, alargando-se a outros países europeus na década de 1950. A Pax Christi foi reconhecida como movimento internacional católico pela paz pelo Papa Pio XII em 1952. (6)

24/02/2023

A equipa assume a gestão editorial de Terra da Fraternidade, mas os textos de reflexão vinculam apenas quem os assina.

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(1) Sobre a doutrina da “guerra justa,” ver Sérgio Dias Branco, OP, “A Injustiça da Guerra,” Pontos SJ, 12 Nov. 2020, https://pontosj.pt/opiniao/a-injustica-da-guerra.
(2) Pax Christi, “Mission & Vision” (trad. minha), https://paxchristi.net/mission-vision.
(3) Ver Pax Christi UK, “About Pax Christi,” https://paxchristi.org.uk/about-us/about-pax-christi.
(4) Frei Betto, OP, “Sem Justiça não há Paz,” O Dia, 19 Out. 2014, par. 9, https://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2014-10-18/frei-betto-sem-justica-nao-ha-paz.html.
(5) Ibid.
(6) Etienne de Jonghe, “Pax Christi International: The Role and Perspectives of an International Catholic Peace Movement,” CrossCurrents 33, n.º 3 (1983): 323.

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