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Edgar Silva nasceu no Funchal em 1962, como Padre Católico acompanhou projectos de desenvolvimento humano e social em bairros da ultra periferia e o Movimento Apostolado de Crianças, que denunciou a exploração sexual e o trabalho infantil dos "miúdos das caixinhas”, com direito a perseguição dos poderes insulares; de 1992 a 1995 foi Assistente Nacional do Movimento Católico de Estudantes, em 1997 deixou o sacerdócio.

É membro do PCP desde 1998, responsável da Organização da Madeira e membro do Comité Central desde 2000; foi deputado na Assembleia Regional desde 1996 e eleito na Freguesia de Santo António e na Assembleia Municipal do Funchal, foi candidato a Presidente da República em 2016.

Edgar Silva tem obra publicada sobre questões de desenvolvimento humano e social e um vasto perfil académico - licenciatura e mestrado em Teologia mestrado em História das Religiões, bolseiro de doutoramento com tese sobre catolicismo social e compromisso político, bolseiro do Instituto Camões em Roma, doutorado em História com a tese Vendaval de Utopias e bolseiro pós-doutorado na Universidade Católica.

“Vendaval de Utopias” lançado na Feira do Livro

A 15 de Junho foi apresentado o livro “Vendaval de Utopias, os católicos da revolução e o PCP”. Participaram Rui Mota da Editorial Página a Página, o autor, Edgar Silva, do Centro de Estudos de História Religiosa da Universidade Católica e Carlos Gonçalves, da Direcção do PCP e mais de setenta pessoas acompanharam a iniciativa

“Vendaval de Utopias” lançado na Feira do Livro

Este livro é um ensaio histórico importante, uma nova abordagem da Tese de Doutoramento de 2023, sobre o percurso da vanguarda católica na fase final da crise do fascismo, de 1965 à Constituição da República de 1976.

Numa introdução sobre as posições do PCP nesta matéria, Carlos Gonçalves lembrou que o Partido formulou as teses da interacção de comunistas e católicos num texto de Álvaro Cunhal de 1943, sobre “a unidade da nação portuguesa na luta pelo pão, liberdade e independência”, que integrava a tese “a mão estendida aos católicos”, que dizia: “muitos sacerdotes são inimigos da Alemanha nazi, centenas de milhar de trabalhadores são influenciados pelo catolicismo, não podemos separar-nos dos operários e camponeses católicos, ou (os) atraímos para a luta contra o fascismo, ou deixamos que se constituam em (sua) reserva”. “Não fazemos “guerra à religião” não pretendemos atingir a liberdade de crença e de culto, estendemos a mão aos católicos para que participem no movimento nacional contra o fascismo”.

“Lutamos contra o sectarismo de muitos militantes e antifascistas. Houve erros de intolerância em 1910 que não devem repetir-se”. “O PCP respeita rigorosamente e opõe-se a qualquer ofensa a sentimentos religiosos. Os interesses dos portugueses identificam-se pelas classes a que pertencem e não pela religião; na inteligência e coração do povo podem coincidir a crença religiosa e a luta pela liberdade e democracia, os ideais do socialismo e solidariedade”. “As convicções religiosas não são susceptíveis de afastar os homens de um programa social e político, comunistas e católicos podem e devem unir-se em defesa (de) anseios comuns”. O fascismo diz "que é impossível (o) entendimento, (mas) a verdade é que aquilo que nos separa nada é comparado com o que nos une”.

Em 1965, no “Rumo à Vitória”, Álvaro Cunhal saudou os “círculos católicos (que) se separaram do regime, os fascistas ameaçaram que, por cooperarem com os comunistas, deixam de ser católicos, se por hipótese o próprio Papa nega apoio à política fascista, logo passa (ao) «campo do inimigo»”, como sucedeu em 1970 quando Paulo VI concedeu audiência aos movimentos de libertação das ex-colónias.

Em 1974, Álvaro Cunhal afirmou uma ideia que se mantém actual: “os comunistas defendem boas relações do Estado com a Igreja, (isto) não se baseia em critérios de oportunidade, mas numa posição de princípio. O mundo evolui e a Igreja mostra indícios positivos (como se confirma). Confiamos que se compreenda a sinceridade e as profundas implicações para o presente e o futuro desta posição do PCP”.

Estes princípios traduziram-se na participação de católicos da revolução, padres e leigos progressistas, nos movimentos sociais, nas frentes de unidade antifascista, nas lutas da crise da ditadura, no 25 de Abril e na construção e defesa da democracia. Hoje, as causas de convergência e intervenção progressista e antifascista mantêm actualidade, e por isso, além do seu valor como ensaio histórico, o livro é um importante contributo para o futuro.

Na sua intervenção Edgar Silva, saudou e agradeceu à Editora, aos presentes na sessão e aos que ajudaram na construção do livro, que trata a acção “de uma “«vanguarda» no campo católico, mais expressiva a partir de 1965, a que correspondeu uma dinâmica catalisadora de sectores do catolicismo para um conjunto de atitudes críticas cada vez mais acentuadas face à situação da Igreja Católica e da ditadura fascista”.
A categoria instrumental, «vanguarda» é a “adequada para identificar um processo que foi plural nos fundamentos das ideias e descontínuo quanto à efectivação de compromissos políticos. A formação da linha de vanguarda nunca correspondeu a uma unificada intervenção, nem a uma estruturada organização conjunta dos cristãos”. O conceito de «vanguarda» é mais amplo e plural, que o de «oposição católica» - mais ajustado a D. António Ferreira Gomes, à “Carta a Salazar” de 1958, ao movimento em sectores do clero e ao exílio do Bispo do Porto.

“O apuramento sobre essas gerações de militantes católicos densificou-se através de conceitos dissonantes, mas que se entrecruzam na compreensão de um empenhamento na construção de uma nova sociedade. Designados «católicos conscientes», «católicos progressistas», ou «cristãos ativos», reportam-nos para um debate sobre a caracterização de um campo amplo e plural, de percursos de intervenção e activismo no combate ao regime de Salazar e Caetano.”

O livro avoca “o conceito de «vanguarda católica» enquanto delimitador das dinâmicas do confronto de sectores católicos com o regime, de contestação à hierarquia, contra as ligações de dependência e promiscuidade com o poder político, como a crescente contraposição à ditadura fascista, a luta antifascista e a exigência de democracia, explicitando o papel da vanguarda católica e sua participação política, com a valorização dos seus contributos no impulsionar de movimentos eclesiais contemporâneos”.

O livro visa” três objectivos fundamentais: contribuir para formular um novo quadro interpretativo das questões relativas ao papel dos movimentos sociais na transformação da sociedade portuguesa e na oposição à ditadura fascista; demonstrar como sectores católicos na intervenção política durante a ditadura fascista fizeram uma opção revolucionária - os “católicos da revolução” -, na passagem da militância social a uma militância política subversiva; analisar como na luta pela democracia se configuraram alianças sociais em Portugal, fazendo convergir sectores católicos e comunistas.

«Vendaval de utopias» é uma expressão de 1998 de D. José Policarpo, Cardeal de Lisboa, no matrimónio de José da Felicidade Alves, “para caracterizar os longos anos 60 e 70, os ventos de mudança e renovação semeados pelo Concílio Vaticano II, contribuindo, assim, para uma contextualidade cultural, política e social das viragens estruturais na Igreja Católica e no Mundo”.

Além da introdução e conclusões, o livro organiza-se em cinco capítulos: i) intervenção política dos católicos; ii) dinâmicas da sociedade e relação entre o PCP, os católicos e a Igreja; iii) convergências no movimento da paz; iv) iniciativas “unitárias” e alianças sociais no mundo do trabalho; v) defesa dos presos políticos e suas famílias.

A intervenção política dos católicos é contextualizada aos “tempos modernos”, do iluminismo, da secularidade, do materialismo histórico marxista, da transformação e do devir da humanidade, na “aproximação aos evangelhos”, no quadro do Vaticano II, da “teologia da revolução” e na influência da “teologia da libertação”, da “evolução desde o catolicismo social à práxis” de intervenção e ruptura. Em Portugal, revisitam-se eventos significativos da luta contra o fascismo, com intervenção de católicos, anteriores e posteriores a 1965, e as suas implicações na evolução ideológica da sua pluralidade.

“No livro, os «católicos da revolução» são aqueles cujos percursos de vida implicaram «mergulhar» em dinâmicas revolucionárias, em projectos e organizações cuja orientação objectiva era fazer a revolução em Portugal. Para os «católicos da revolução» a exigência de ruptura revolucionária do regime é o elemento unificador e identificador, uma vez que, acerca da natureza da revolução existem orientações não coincidentes”.

As dinâmicas da sociedade e a relação entre PCP, católicos e Igreja, partem do “anátema” anticomunista da hierarquia católica, depois alterado por João XXIII, Paulo VI e o Vaticano II, até ao diálogo e convergência na acção.

Apesar da condenação, o diálogo de católicos com comunistas avançou em França, Itália, Espanha, nas frentes populares e no combate ao nazi-fascismo. Em Portugal, as ideias de “revolução satânica” e “invasão marxista” estruturavam a intervenção do Cardeal Cerejeira nesta fase, em contraponto à “mão estendida aos católicos”, mas já em 1941 o Padre Abel Varzim relatava ao Presidente da Acção Católica, uma reunião com militantes comunistas, só possível a partir da “confiança entre militantes da LOC e do PCP”.

A relação, entre Pedro Soares, do Comité Central do PCP e o Padre Abel Varzim, que em 1952 organizou um relatório para o Vaticano sobre o PCP, alargou-se a novas situações, como na convergência com o Bispo do Porto, nas iniciativas anti-colonialistas de Roma, nas CDEs, na Capela do Rato e nos movimentos sociais – pela Paz, contra a guerra colonial, na fundação da CGTP, na defesa dos Presos políticos – aprofundadas no plano teórico e quanto aos envolvidos nas páginas do livro.

Mais do que a “história da salvação” é a “salvação da história” que constitui o objecto deste Livro. Não se trata de uma inexistente “revolução católica”, mas sim da intervenção dos “católicos da revolução” na transformação da sociedade, apoiados na sua dinâmica revolucionária e na “Teologia da Revolução”, na militância do agir, com os comunistas e outros democratas, ou como membros do PCP, em percursos plurais, mas convergindo em movimentos sociais, que trouxeram à luta novos sectores sociais, o próprio movimento dos capitães, o MFA, que abriu caminho ao futuro em 25 de Abril de 1974.

26/06/2024

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