Um ano depois da JMJ
Já fez um ano que se concretizou o acontecimento que foram as Jornadas Mundiais da Juventude. O entusiasmo foi grande.
Joaquim Mesquita é operário fabril do sector alimentação, dirigente da CGTP-IN, e militante da Base-FUT e da LOC-MTC.
As palavras e afirmações do Papa Francisco foram encorajadoras, redobrando o ânimo a quem tem vontade de ir transformando o mundo para melhor; e quem melhor que os jovens para essa tarefa? Tanto mais que este Papa não se afirma simplesmente pelas suas palavras, mas por estar onde a sua presença é necessária: com os jovens, com os pobres, com os marginalizados, porque “ser” é, essencialmente, “estar”.
A esta distância da JMJ parece possível tentar perceber que frutos estão a desenvolver-se, saber se a sociedade progride no sentido da fraternidade. Não é tarefa da Igreja apresentar propostas ideológicas, filosóficas ou políticas, mas a sua missão evangelizadora, de convite à construção de sociedades fraternas, compromete-nos. O que temos estado a fazer, entretanto? A começar pela paz. Ignoro se as Igrejas ortodoxas representadas em Portugal foram contactadas, e se lhes foi dada a oportunidade de darem o seu contributo, em contexto da iniciativa JMJ, para a concretização do Reino de Deus, que passa por construir caminhos de diálogo, convívio fraterno e paz. Se foram ignoradas, tratou-se de um grave erro, que nem um oceano de água benta conseguirá apagar, e um incentivo à economia de guerra que Portugal e a Europa, servil e obedientemente, parecem estar a querer seguir. Um bom governante, tal como um bom pastor, é aquele que livra o povo da guerra, não o que a abençoa.
Como cristão, vou mantendo a esperança no progresso civilizacional que a Igreja tem a capacidade de promover. Contudo, vemos que os agiotas – os verdadeiros senhores do mundo, e quem realmente governa na quase totalidade dos países do designado Ocidente “livre e democrático” – continuam a explorar os cidadãos, trabalhadores e consumidores. Que temos nós feito para alterar esta ideologia de mercado, conduzida por sociedades anónimas, onde o dinheiro funciona como a forma mais eficaz de tirar aos pobres o pouco que eles têm? Algo falha quando a injustiça predomina e se perpetua, produzindo multidões de pobres e marginalizados sob o jugo de alguns exploradores que enriquecem. Neste contexto, pretender construir Igreja (Comunidades) torna-se um exercício de hipocrisia. Não se pode conciliar o inconciliável ou adoptar o situacionismo como critério. Quando existe muita harmonia com os poderes do mundo, é sinal de que a Igreja não está a cumprir o seu papel profético e sacerdotal. Os poderes do mundo e o poder religioso sempre se entenderam bem para eliminar a voz (luz) dos que incomodam (Mc 15,1; Mt 27,1 ss; Lc 22,66; 23,1; Jo 18,28).
Se queremos aproveitar a dinâmica do acontecimento que foi a JMJ, é sempre tempo de dinamizarmos o esforço pela justiça social, de solidariedade para com os oprimidos e explorados. Esta missão é uma questão teológica e existencial, não apenas doutrinal, para não corrermos o risco de transformar essa doutrina em ideologia. Há que concretizá-las em comunidades fraternas, porque a razão da nossa fé é o Reino. É em comunidades que se encontram caminhos de solidariedade, se constroem estruturas de fraternidade entre povos e que a palavra PAZ adquire o seu verdeiro sentido e significado. Foi essa capacidade de congregar gente simples, humilde (pobre em espírito) que teve, no seu tempo, Jesus Cristo, que não teve filhos, não plantou árvores e não escreveu livros. Deixou-nos apenas o exemplo de vida, que o papa Francisco se empenhou em lembrar aqui, nas Jornadas Mundiais da Juventude.
17/09/2024
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