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IA, Irmandade e Amizade

A IA, sigla de Inteligência Artificial, anda pelas bocas do mundo. Prenunciará do fim do mundo? Será uma solução para todos os problemas contemporâneos? Uma abordagem sensata e consequente considera as promessas e os riscos do desenvolvimento da inteligência específica das máquinas computarizadas. Recentemente, o Papa Francisco deu um contributo importante nesta linha, evitando o fatalismo e o triunfalismo, com os olhos voltados para um futuro de progresso, justiça e paz.

IA, Irmandade e Amizade

Sérgio Dias Branco é professor da Universidade de Coimbra, dirigente da CGTP-IN, e leigo da Ordem Dominicana da Igreja Católica.

Na Mensagem deste ano para o Dia Mundial da Paz, Francisco reflectiu sobre o tema das novas tecnologias. Enquadra a questão no potencial criativo da inteligência humana como expressão da nossa dignidade própria e no contexto da criação divina. Este potencial exige, no entanto, um conjunto de princípios para avaliar o sentido e o uso dos avanços científicos e tecnológicos. Neste sentido, o Papa defende que “a imensa expansão da tecnologia deve ser acompanhada por uma adequada formação da responsabilidade pelo seu desenvolvimento. A liberdade e a convivência pacífica ficam ameaçadas, quando os seres humanos cedem à tentação do egoísmo, do interesse próprio, da ânsia de lucro e da sede de poder.” Se estes avanços “não conduzem a uma melhoria da qualidade de vida da humanidade inteira, nunca poderão ser considerados um verdadeiro progresso.”

Francisco sublinha que os progressos técnico-científicos, e o tipo de controlo que permitem, colocam nas mãos da humanidade “um vasto leque de possibilidades, algumas das quais podem constituir um risco para a sobrevivência humana e um perigo para a Casa comum.” Estes progressos têm alterado profundamente as formas de comunicação, a gestão da administração pública, os métodos de ensino, a compra e venda de produtos, as interacções pessoais e de variados aspectos da vida quotidiana — criando desinformação e interferências, replicando injustiças e preconceitos, facilitando o acesso a armas e outros artigos perigosos, numa lógica marcada pela agressividade e pela violência. É possível e necessário que estes avanços sejam utilizados na prossecução da paz e do bem comum, do desenvolvimento integral do indivíduo e da comunidade.

A mensagem insiste que as máquinas inteligentes “podem desempenhar as tarefas que lhes são atribuídas com uma eficiência cada vez maior, mas a finalidade e o significado das suas operações continuarão sendo determinados ou capacitados por seres humanos com o seu próprio universo de valores.” Num ponto anterior, salienta que quando os avanços “agravam as desigualdades e os conflitos, nunca poderão ser considerados um verdadeiro progresso.”

Como a preocupação com a paz está no centro do texto, “as graves questões éticas relacionadas ao setor dos armamentos” não podiam ficar de fora. “A possibilidade de efetuar operações militares através de sistemas de controle remoto levou a uma percepção menor da devastação por eles causada e da responsabilidade da sua utilização, contribuindo para uma abordagem ainda mais fria e destacada da imensa tragédia da guerra,” realça Francisco.

A IA insere-se num desenvolvimento científico e técnico na era digital e traz potencialidades, mas também riscos para a vida social e a democracia que requerem avaliação, regulamentação, e medidas preventivas. A ética exige reclama que deve ser utilizada para favorecer e incentivar “a fraternidade e a paz,” a irmandade e a amizade social e entre povos. Se assim fosse, a inteligência artificial poderia ser utilizada “para promover o desenvolvimento humano integral, poderia introduzir inovações importantes na agricultura, na instrução e na cultura, uma melhoria do nível de vida de inteiras nações e povos, o crescimento da fraternidade humana e da amizade social. Em última análise, a forma como a utilizamos para incluir os últimos, isto é, os irmãos e irmãs mais frágeis e necessitados, é a medida reveladora da nossa humanidade,” como sublinha Francisco. Transformemos “as espadas em relhas de arado.”

26/01/2024

A equipa assume a gestão editorial de Terra da Fraternidade, mas os textos de reflexão vinculam apenas quem os assina.

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